Livre para obedecer

"Não é questão de acreditar. É o Tribunal Superior Eleitoral quem dá o resultado oficial da eleição"

Por Guilherme Fiuza (*)

Tá fazendo o que aí?

— Protestando.

Protestando contra o quê?

— Contra a eleição.

Você é contra eleição?

— Não. A favor.

Então tá protestando por quê?

— Porque sou a favor de eleição limpa.

Você acha que a eleição não foi limpa?

— Acho.

Mas foi limpa.

— Isso é o que você tá dizendo.

Isso é o fato.

— Quem disse?

O TSE.

— Você acredita no TSE?

Não é questão de acreditar. É o Tribunal Superior Eleitoral quem dá o resultado oficial da eleição.

— Oficial não quer dizer legal.

A legalidade é conferida pela autoridade, que é a representação oficial.

— Isso no caso de a autoridade agir corretamente.

Quem disse que a autoridade não está agindo corretamente?

— Eu.

Quem é você?

— Eu sou eu. Esse que está diante de você.

Perguntei quem é você pra condenar a autoridade?

— Ninguém. Não condeno ninguém. Só falo sobre o que vejo. E critico o que desaprovo.

Você não está criticando. Está desinformando.

— Não. Estou protestando.

Está induzindo outras pessoas a acreditarem numa falsidade, portanto está desinformando sim, e isso é grave.

— Grave, quanto?

Muito grave. Gravíssimo.

— Onde está escrito isso?

Todo mundo sabe que desinformar é gravíssimo.

— O Direito foi substituído pelo Todo Mundo Sabe?

Você não devia brincar com uma situação tão grave.

— Quem está brincando é você.

Brincando de quê?

— De legislar.

Vamos parar de dar voltas.

— Não estou dando voltas. Estou parado, aliás há um bom tempo. E vou continuar aqui.

Não vai, não.

— Por quê?

Porque o seu protesto é ilegal.

— Onde está a ilegalidade?

No ato de levantar suspeitas sobre uma eleição limpa.

— Eu expresso o que eu quiser, sobre o que eu quiser. Se alguém se sentir ofendido que vá à Justiça.

Não precisa.

— Por quê?

Porque a Justiça sou eu. Estou aqui para te dizer o que você não deve fazer e falar, economizando o seu tempo e o de quem você ofender.

— Não é assim que funciona uma democracia.

Não mesmo. Mas aqui é.

— Aqui não é uma democracia?

Não.

— Ah, bom. Por que você não falou isso antes?

(*) Jornalista e escritor carioca, é autor de títulos como Manual do Covarde (2018), O Império do Oprimido (2016), 3.000 Dias no Bunker (2006) e Meu Nome Não É Johnny (2004). Também roteirista de TV, autor de teatro e analista político, é uma voz de destaque no debate contemporâneo.

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