Comunidade repudia instalação de aterro sanitário durante audiência pública em Iranduba

Projeto no município vizinho, sem licitação, visa atender resíduos de Manaus

Foto: Divulgação

Moradores de comunidades e ramais do município de Iranduba (situado a 28 quilômetros de Manaus) repudiaram a instalação do aterro sanitário privado no km 19 da Estrada Manoel Urbano (AM-070), projeto tocado pela empresa Norte Ambiental Ltda.

Durante audiência pública realizada neste domingo (22.01.23), ficou clara a posição da comunidade contrária, que se encontra sob análise do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), órgão responsável por conceder o licenciamento ambiental e estabelecer os prazos e normas para implantação do aterro.

A previsão é de que o local receba até 3 mil toneladas de resíduos/dia, podendo incluir o descarte de lixo de outros municípios da Região Metropolitana de Manaus.

Um abaixo-assinado, organizado por moradores e lideranças de comunidades locais, circulou durante a audiência para coleta de assinaturas.

Desde junho de 2021, a população vem se mobilizando pela conscientização das pessoas em Iranduba e Manaus, quanto aos prejuízos causados ao município vizinho da capital amazonense, principalmente, os relacionados à desvalorização do destino turístico.

Na última semana, dois protestos foram realizados na região Central de Manaus.

“Não queremos e não aceitamos esse aterro sanitário privado que não sei de onde veio. Tanto lugar pra ir e querem se instalar em um local onde tem escola ao redor, pessoas morando? Que ódio é esse contra as pessoas de Iranduba? Não tem nenhuma autoridade, prefeito, governador, ninguém a nosso favor! Graças a Deus nós temos o povo que está nos ajudando, aderindo a essa causa, lutando, gastando sua gasolina, indo com criança para as manifestações”, afirma Andleane Fonseca Garcia, 36, moradora da Vila de Paricatuba, localizada no km 21 da AM-070, um dos pontos turísticos da cidade.

Representantes da Associação De Catadores De Iranduba-nova Esperança, localizada no bairro Centro, em Iranduba, ressaltaram que a população quer melhorias para o aterro público do município, transformando-o em aterro sanitário, mas que seja um processo previamente discutido com a comunidade e que seja referente aos resíduos dos moradores locais.

Representante do Movimento Fórum das Águas, Sandoval Rocha, ressaltou que, na área onde o aterro sanitário deve ser construído, existem 62 nascentes de água ao longo de 36 quilômetros de igarapés, todos desaguando no Rio Negro.

Além disso, a região é habitada por agricultores familiares, condomínios residenciais e empreendimentos balneários e restaurantes voltados ao turismo. O impacto em praias, cachoeiras e sítios arqueológicos não foram dimensionados.

Em sua fala, o advogado José Roque Nunes Marques, que representa nove associações de produtores locais, ponderou “cabe ao poder publico municipal a responsabilidade exclusiva sobre coleta de resíduos, o tratamento e a destinação adequada para os resíduos sólidos urbanos”, conforme prevê o artigo 302 da Lei Orgânica do Município de Manaus e do Plano Municipal de Resíduos Sólidos de Iranduba.

“Precisamos de respostas; há uma ausência de autorização legal para despejo do lixo de Manaus e região em Iranduba. a implantação desse tipo de empreendimento passa, necessariamente, pelo poder público e não existe consórcio, autorização, é uma atividade que e própria do poder público. A Câmara Municipal de Manaus, por exemplo, tem que se manifestar. Quando a Prefeitura de Manaus está disposta a pagar por transformar isso aqui num lixo? Isso não é gratuito, cada município cuida do seu lixo”, afirmou.

Nunes Marques ressaltou que, para além dos possíveis impactos ambientais, existem trabalhadores que tiram seu sustento dessa região por meio do abastecimento de hortifruti da cidade de Manaus.

“Se nos tirarmos esta condição deles, vamos estar matando essas pessoas. Aqui tem um potencial turístico extraordinário e o que a comunidade está dizendo, na verdade, é que temos outras opções mais interessantes que não seja uma montanha de lixo”, disse.

Foto: Divulgação

Ilegalidades

Esta é terceira audiência pública sobre o projeto, parte legal para autorização de funcionamento e cujo trâmite estava suspenso desde abril de 2022, pela decisão da juíza Aline Kelly Ribeiro Marcovicz Lins, na Ação Civil Pública n.º 0800023-17.2022.8.04.0110, proposta pelo Ministério Público do Estado do Amazonas, sob a alegação de  ausência de processo licitatório, entre outras irregularidades.

“As graves violações às normas de proteção ambiental, em especial por inexistir processo licitatório para instalação de aterro sanitário em Iranduba e pelo empreendimento estar inserido em área de proteção ambiental, demonstram a imperiosidade de suspensão do licenciamento ambiental”, afirmou a magistrada à época.

A juíza também considerou que algumas das irregularidades são insanáveis, visto que o empreendimento se situa em local cuja exploração da atividade é inapropriada por se tratar de área de proteção ambiental, como não há processo licitatório, não resta outra medida senão a interrupção do processo de licenciamento ambiental.

A audiência deste domingo (22.01.23), realizada na Escola Estadual de Tempo Integral Maria Izabel Xavier Desterro e Silva, localizada no Km 1 da rodovia Carlos Braga, em Iranduba, foi retomada a partir de um pedido da Prefeitura de Iranduba pela derrubada da decisão liminar que suspendia o trâmite de licenciamento, inclusive as audiências.

Durante a audiência a empresa alegou estar investindo no município e sem utilização de recursos públicos e, por isso, estaria desobrigada de passar por qualquer certame licitatório.

A Associação Brasileira de Empresas de Tratamento de Resíduos e Efluentes (Abetre) informou, na audiência, que esse procedimento é feito sem concorrência pública a exemplo do que acontece em estados como Bahia, Rondônia, Pará e Mato Grosso do Sul.

Morador da comunidade Cacau Pirera, David Souza, 21, disse ser a favor do projeto porque não quer mais ver o lixo escorrendo para dentro do rio onde costumava tomar banho quando era pequeno.

“No meu tempo eu podia pular e agora não dá, quando chove é um terror. O saneamento lá também ajudaria muito”.  Questionado se houve alguma promessa da Prefeitura ou da empresa sobre isso, ele respondeu que não. “Mas tenho esperança que possa acontecer”.

Por Steffanie Schmidt 

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