Quando iremos revisitar o capitalismo?

Nelson Azevedo (*) [email protected]

A política fiscal de Chicago começou a formalizar seus dois grandes anseios de ordenamento tributário para o Brasil. Um deles já está em andamento desde o primeiro ano de ensaios liberais, ou seja, reduzir benefícios fiscais, mas não sobre a totalidade do bolo. Claro! A economia do país não se sustentaria, muito menos o apetite do Leão sossegaria. Não há notícias de maiores alterações nessa padrão secular que opõe o Norte e o Sul da brasilidade. Podemos mencionar, timidamente, a isenção de pequenas taxas de imposto para os veículos para portadores de deficiência física e idosos. Entretanto, podemos destacar, substantivamente, os cortes de compensações fiscais da Zona Franca de Manaus. Aqui não começou a valer o mote “menos Brasília e mais Brasil”. Novamente, a economia do Amazonas tem lugar e tarefas à parte. Afinal, fomos escolhidos para pagar o pato(sem tucupi) da política fiscal ditada e usufruída por quem mais desfruta do bolo de isenções fiscais, 92% dos gastos do país?

Incentivos fiscais e compensação tributária

Há muitas indagações e divagações a serem feitas. E temos registrado muitas contradições neste espaço editorial. Uma delas é um paradoxo segundo o qual a política de compensação fiscal para a Amazônia, uma região remota como a nossa – sem estradas de conexão com o Brasil  e com uma infraestrutura pra lá de precária – é responsável pelo esculacho fiscal desta nação. Mesmo que todos desenhássemos a verdade isso não serviria para inibir os incessantes ataques e ameaças  brasilienses que ensaiam desconstruir nosso programa de tantos acertos para redução das desigualdades regionais. Ora, o resultado dessa modesta fatia de 8%, destinada à política de desenvolvimento regional, a cargo da Suframa, devolve generosamente mais de 70% da riqueza aqui apurada para a União. É pouco? Basta olhar o quadro dos cinco maiores contribuintes da Receita. Ali está o Amazonas e o montante de sua contribuição generosa ao Tesouro. Que sentido tem confiscar este montante de uma região tão pobre como a ilharga da Amazônia, onde estão os piores IDHs do Brasil? E quem sabe dizer o resultado em termos de benefícios a sociedade de quem se apropria de 92% dos incentivos fiscais da Receita?

Quem ganha e quem perde?

Avaliando quem ganha e quem perde nesta aritmética fatiada de uma reforma fiscal conta-gotas, é curioso observar que a taxação das grandes fortunas esbarrou na distribuição de prêmios e danos que resultaram na punição do setor produtivo. Por favor, ajudem a deixar bem delineada a distinção entre setor produtivo e setor financeiro. Este segue incólume. Aquela que horizontaliza oportunidades e verticaliza historicamente as contribuições ao erário, o setor produtivo, vai passar no próximo ano dos atuais 34% para 45,2 e, a partir de 2023, para 43,2%. Durma com um barulho desses, ou melhor com esta festa do arromba, compulsiva e barulhenta, em celebração da conquista e realização do segundo e estranho anseio dos rapazes da banda do Chicago Boys: aumentar a carga tributária do setor produtivo, o esteio sagrado do capitalismo.

Um semestre para pagar imposto

Por A mais B, os técnicos da CNI concluíram que neste cenário será inevitável reduzir o crescimento. E demonstraram que as medidas da mini-reforma vão inibir o ambiente de negócios, tão necessários para colocar o país na retomada do crescimento industrial e do desenvolvimento socioeconômico. Passar de cinco para seis meses por ano a obrigação das empresas de trabalharem para o governo, confirma a decisão, já anunciada por algumas agências federais de planejamento estratégico, de induzir o processo de desindustrialização do país. E priorizar o agronegócio? De que jeito? Aumentado-lhe a fatia de isenção? Por que penalizar a indústria, num contexto absurdo de desemprego e fome que o país atravessa?

Um capitalismo sem consumidores

Curiosamente, ninguém destacou com ênfase e insistência qual será a hora do intervalo desta fatia da reforma tributária em que podemos falar e pautar  a reforma administrativa, aquele que vai rever as grandes fortunas salariais. Ou teremos que passar o resto da vida trabalhando para pagar salários deste formato administrativo que segue amarrado, pesado e ineficiente? Seriam os beneficiários tão intocáveis como as fortunas bacanas do sistema financeiro que,  apesar da crise hídrica e energética costumam depois de deixar as salas da brasilidade não sentem necessidade de apagar as luzes? Assim fica difícil, e se cada um não fizer sua parte, o todo vai seguir deficitário, desarticulado e capenga, num capitalismo em que o patrão é o burocrata e a massa desempregada de trabalhadores há muito não cumprem seu papel de consumidores, ameaçando a premissa econômica e elementar da produção.

(*) Nelson é economista, empresário, presidente do Sindicato da Indústria Metalúrgica, Metalomecânica e de Materiais Elétricos de Manaus, Conselheiro do CIEAM e vice-presidente da FIEAM.

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