O Brasil virou pária

Eis o Brasil, graças ao ministro Dias Toffoli, colocado entre os países sem lei, sem códigos morais e sem vergonha que fazem parte da face escura da humanidade

Dias Toffoli e Alexandre de Moraes transformaram o Brasil em pária internacional - Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock/STF/SCO

Por J. R. Guzzo (*)

Tinha de acontecer, mais cedo ou mais tarde — e é óbvio que acabou acontecendo. O Supremo Tribunal Federal tantas fez para proteger a corrupção no Brasil, mas tantas, com tanta arrogância e tão pouco caso com o decoro mínimo esperado de sua conduta, que conseguiu enfim chamar a atenção do mundo para o que estão fazendo aqui. Um ano atrás a porção da comunidade internacional que se considera mais civilizada e mais apta a decretar regras de comportamento para as demais festejava a “vitória da democracia” no Brasil. Que sorte para o planeta, não? O perigo do “populismo de direita” foi derrotado. O amor venceu. O Brasil “voltou”. Não contavam com a astúcia do ministro Dias Toffoli. Em apenas um ano, com a sua inédita sucessão de sentenças em favor da ladroagem e dos ladrões, ele conseguiu demolir toda essa conversa. Eis o Brasil, por sua conta, colocado entre os párias do mundo — os países sem lei, sem códigos morais e sem vergonha que fazem parte da face escura da humanidade.

A destruição do STF como uma casa de respeito já era obra avançada, com o teto e as paredes no chão, pela atuação do ministro Alexandre de Moraes. Ele, com o STF atrás de si, aboliu os direitos civis que estão na Constituição para instalar uma ditadura penal no Brasil — aberração que transformou o Supremo em delegacia de polícia destinada a reprimir adversários políticos do regime atual. Mais dia, menos dia, a sua vez vai chegar. Moraes tem tudo para acabar no noticiário da imprensa internacional como uma dessas figuras de Terceiro Mundo que aparecem, de tempos em tempos, como sucessores de Idi Amin quando o ditador entrava em sua personalidade de magistrado. Mas Toffoli chegou antes. A insegurança jurídica criada nos últimos anos pelo STF, na qual ninguém sabe qual é a lei que está valendo hoje, superou as fronteiras da violação às garantias democráticas e mergulhou de cabeça no bas-fond da roubalheira do Erário. Aí já ficou demais. É como o sujeito que em vez de tirar o calção de banho dentro da piscina, para ninguém ver, sobe no trampolim para mostrar a todo mundo que está nu.

A verdade sobre o alto Judiciário no Brasil, conhecida aqui dentro, mas escondida nesse tempo todo pela mídia internacional de primeira linha, veio à luz do sol da pior maneira possível para o STF. O Financial Times de Londres, que funciona como um boletim de comportamento para governos e nações de todo o mundo, publicou uma exposição 100% objetiva, competente e arrasadora sobre a atual disparada da corrupção no Brasil — e o papel essencial que Toffoli e o STF exercem nesse conto de horror. É muito ruim, porque o Financial Times está entre a meia dúzia de veículos de imprensa que são lidos em salas de diretoria, reuniões de ministros do Primeiro Mundo e os gatos mais gordos da alta burocracia global. É acompanhado nos departamentos de marketing e pelos fiscais mais severos da obediência ao politicamente correto. Enfim, para resumir a ópera: está entre as leituras preferidas da turma de Davos que deixa Lula, a ministra Marina e a direção do PT sempre tão agitados. Pior que tudo, talvez, uma matéria publicada ali serve como uma espécie de “liberou geral” para a elite da mídia globalizada. Saiu no FT? Então pode sair em qualquer lugar.

Notícia publicada no jornal Financial Times (5/2/2024): “Supremo Tribunal Federal ordena investigação de grupo anticorrupção” – Foto: Reprodução/FT

Está tudo ali. A anulação da multa de R$ 10 bilhões da J&F e de R$ 3,8 bilhões da Odebrecht que, por força de acordo judicial, as duas empresas se comprometeram a pagar para seus diretores não serem presos pelo crime de corrupção ativa. Toffoli, sozinho, cancelou as duas, de modo que os réus confessos nem foram para a cadeia nem pagaram o que tinham de pagar. É citado o relatório da Transparência Internacional que rebaixou o Brasil em dez posições na lista dos países mais corruptos do mundo em 2023, sua pior colocação desde 1995 — e que cita nove vezes o nome de Toffoli. O artigo revela a destruição dos sete anos de luta contra a corrupção feita pela Lava Jato. Cita os 2,2 mil anos de sentenças de prisão anulados em favor dos 165 ladrões condenados. Menciona a anotação que o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos fez sobre a ladroagem da Petrobras nos governos Lula-Dilma — segundo os americanos, o maior caso de propina já registrado na história. Revela aos leitores mais qualificados do mundo que Toffoli foi advogado do PT antes de ser nomeado por Lula para o STF. Informa que o ministro Cristiano Zanin foi advogado pessoal do mesmo Lula.

É um desastre com perda total. “Graças às decisões de Toffoli, o Brasil tornou-se um cemitério de provas de crimes que geraram miséria, violência e sofrimento humano”, diz o Financial Times, citando o texto da Transparência Internacional. “O país está se tornando cada vez mais, aos olhos do mundo, um exemplo de corrupção e de impunidade.” O jornal informa também qual foi a reação do ministro diante do relatório: mandou investigar criminalmente a entidade, com base numa notícia patentemente falsa, e já enterrada há muito tempo, sobre ilegalidades imaginárias que teria praticado no Brasil. É uma das regras de ouro da filosofia penal do já citado Idi Amin. “Nós aqui temos liberdade de expressão”, dizia ele. “O que não podemos garantir é a liberdade de quem se expressa.” É o puro STF do Brasil de hoje, só que de efeito real equivalente a três vezes zero. A Transparência Internacional tem sede em Berlim. Não pode ser indiciada, desmonetizada ou presa por Alexandre de Moraes e sua Polícia Federal. É uma perfeita palhaçada.

Em apenas um ano de governo Lula, o país se fechou, mais do que nunca, no clube dos anões diplomáticos. Agora, está a caminho de ser um anão com fama mundial de larápio

A verdade é que o STF está perdendo as noções de ridículo mais elementares. O que dizer, por exemplo, do penúltimo feito da mesma Polícia Federal? Numa hora dessas, justo na hora em que a casa está caindo em volta deles todos, vem a PF querendo ouvir oficialmente o depoimento do ex-presidente Jair Bolsonaro para descobrir se ele incomodou uma baleia no litoral norte de São Paulo. Pode? Depois da notável descoberta, com DNA e tudo, de que havia uma impressão digital numa garrafa de plástico capturada no golpe de Estado do dia 8 de janeiro, além de estilingues e bolas de gude, todos os recursos de investigação científica da PF, com o apoio do Ministério Público e da GloboNews, estão mobilizados nesse assombroso caso da baleia. É um reforço para a tese da “agressão aparente” a Moraes no Aeroporto de Roma, que até hoje é tratada como segredo de Estado pelos “federais” e pelo STF, as joias das Arábias, a delação do coronel Cid e mais do mesmo — uma bomba atômica que vai explodir a qualquer momento, de acordo com as últimas revelações da assessoria de imprensa da PF, mas que até agora não explodiu. O mais recente capítulo da perseguição implacável a Bolsonaro aconteceu nesta quinta-feira. Sob a mesma acusação de tramar um golpe de Estado que nunca houve, seu passaporte foi apreendido (leia a reportagem de Silvio Navarro nesta edição).

STF armas
Plenário do STF – Foto: Reprodução

Com que moral, diante de tudo isso e com as denúncias de favorecimento à corrupção por parte de Toffoli, o STF vai se apresentar diante do mundo para condenar Bolsonaro à prisão? Já vai ter de cassar, através da sua milícia eleitoral do TSE, o mandato do senador Sergio Moro. Já declarou, antes, que Bolsonaro é inelegível por “perigo de gol”; acham, ali, que ele poderia dar trabalho nas eleições de 2026. Vão, agora, colocar o homem na cadeia? Quem vai achar que o STF é um tribunal sério depois de fazer uma coisa dessas — no exato momento em que a opinião pública mundial fica sabendo da destruição de provas, da anulação de multas e do restante da obra de Toffoli e seus companheiros? A situação não melhora em nada, para o STF, com a maciça declaração de “não solidariedade” que foi dada ao ministro por sua parceiragem. Lula, até agora, não deu um pio em favor do amigo acusado por essa organização “alienígena”, como Toffoli classifica a Transparência Internacional. Os magnatas do PT, sempre em estado de guerra, estão em silêncio. Nem os próprios colegas do STF se animaram a sair em sua defesa.

Toffoli e o Supremo, com o apoio compulsivo à corrupção, aos corruptos e aos corruptores, estão empurrando o Brasil para um isolamento cada vez pior em relação às democracias e às nações de bem. Em apenas um ano de governo Lula, o país se fechou, mais do que nunca, no clube dos anões diplomáticos. Agora, está a caminho de ser um anão com fama mundial de larápio. Basta fazer uma relação de fatos. Lula fez sua grande estreia no cenário diplomático colocando-se, na prática, a favor da Rússia na guerra contra a Ucrânia — disse, na verdade, que a Ucrânia é responsável pela invasão do seu próprio território. Fez do Brasil o único país do mundo que se diz democrático e recebe em visita oficial o ditador da Venezuela — que está com a cabeça a prêmio pela Interpol, por US$ 15 milhões, por tráfico internacional de drogas. Ao contrário de todos os países livres, aliou-se à ditadura do Irã, um Estado mundialmente declarado como aliado do terrorismo. Deu o apoio do Brasil a uma denúncia da África do Sul, um dos países mais violentos, corruptos e socialmente injustos da Terra, contra Israel. A causa, por “genocídio”, foi escorraçada do Tribunal Internacional de Haia; Lula só fez o Brasil passar vergonha.

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Lula ficou ao lado dos assassinos do Hamas na agressão que matou 1,2 mil civis, mulheres e bebês de colo em Israel, em outubro. Juntou-se a todas as ditaduras do mundo nas acusações contra Israel por “genocídio”. Está em oposição automática contra tudo o que os Estados Unidos e a Comunidade Europeia defendem. Foi se meter nas eleições da Argentina a favor do lado que perdeu; levou uma sova histórica. Nas últimas eleições no continente, em El Salvador, o candidato da “direita”, anticrime e anticorrupção, ganhou com 85% dos votos. É dele que se fala hoje no mundo. Do Brasil, só as denúncias de facilitação ao roubo do Erário por conta do consórcio STF-Lula. Não consegue ser levado a sério nem na América Latina, da qual se imagina o Guia Espiritual e Político. Seus sonhos mal-acabados de “líder do Sul Global” viraram uma piada. O fato é que o verdadeiro pária do mundo não é mais “o Brasil do Bolsonaro”, como a esquerda passou anos dizendo. É o Brasil de hoje. De um lado a política externa de Lula e das viagens de paxá do primeiro casal. De outro, Toffoli e o Supremo. Não dá, desta vez, para jogar a culpa no “bolsonarismo”, inconformado com a ação do STF em favor das instituições — quem está falando é a Transparência Internacional e o Financial Times, e a acusação é de descriminalizar a corrupção quando ela é praticada pelos parceiros. Sinuca de bico.

(*) J. R. Guzzo é jornalista. Integrante do Conselho Editorial de Oeste, foi um dos criadores da Veja, revista que dirigiu durante quinze anos, a partir de 1976, período em que sua circulação passou de 175.000 para 1 milhão de exemplares semanais. Correspondente em Paris e Nova York, cobriu a guerra do Vietnã e esteve na visita do presidente Richard Nixon à China, em 1972. Responsável pela criação da revista Exame, atualmente escreve no Estado de S. Paulo e na Gazeta do Povo.

Fonte: https://revistaoeste.com/revista/edicao-203/o-brasil-virou-paria/

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