O espectador que se acostumou com a versão conservadora da Jovem Pan terá de se adaptar à nova linha editorial da emissora.
Dois motivos explicam a mudança: a crise financeira do grupo de comunicação, decorrente da saída de patrocinadores e da redução nas verbas publicitárias estatais; e a pressão do Ministério Público Federal (MPF), que pode cassar três concessões das emissoras de rádio da Jovem Pan.
A guinada à esquerda está clara nos bastidores e no noticiário. Em 1º de setembro, por exemplo, dia em que a Polícia Federal (PF) realizou buscas em endereços do ministro das Comunicações, Juscelino Filho, a direção de jornalismo da emissora determinou que os âncoras, os repórteres e os comentaristas ignorassem o caso. A ordem foi seguida à risca.
No canal do YouTube da Jovem Pan, o mais recente vídeo sobre Juscelino foi publicado há um mês. O assunto: inclusão digital.
Um dia depois da operação da PF contra o ministro do governo Luiz Inácio Lula da Silva, o Jornal da Manhã exibiu vídeos de um ato de pré-campanha do deputado federal Guilherme Boulos (Psol), que deve disputar a prefeitura de São Paulo nas eleições de 2024. A exibição do conteúdo era uma ordem expressa dos chefes da emissora.
A Jovem Pan também destacou a mais recente pesquisa do Datafolha para a prefeitura, que põe Boulos na liderança absoluta. Não houve menção aos constantes erros nas pesquisas eleitorais de 2022, que deram ampla margem de vitória a Lula e subestimaram o apoio ao então candidato à reeleição, Jair Bolsonaro (PL).
A exibição de vídeos com tom simpático a Boulos teria o objetivo de pressionar o atual prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), a liberar verbas publicitárias. A mesma estratégia tem sido usada para pressionar o governador do Estado, Tarcísio de Freitas (Republicanos).
“A impressão é que a empresa se vendeu”, disse um profissional renomado da Jovem Pan, em caráter reservado.
Acordo silencioso
A mudança mais visível na linha editorial ocorre semanas depois de uma reunião de executivos da Jovem Pan com representantes do governo federal, em Brasília. No encontro, os porta-vozes da emissora teriam garantido que amenizariam os ataques ao governo Lula e aos candidatos apoiados pelo petista.
Até mesmo comentaristas rejeitados pelo público conservador, como Diogo Schelp, foram demitidos. Ele é crítico de Bolsonaro, mas também de Lula. Ao demiti-lo, a direção de jornalismo da Jovem Pan disse que o motivo é financeiro. Mas também é editorial.
Schelp seguiu o mesmo caminho do advogado e comentarista Tiago Pavinatto, que perdeu o emprego depois de criticar a decisão de um magistrado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP).
“Fui retirado da cadeira que tanto amo por criticar o desembargador que inocentou um pedófilo e chamou a vítima, uma criança, de bêbada, drogada e prostituta”, disse Pavinatto, referindo-se a Airton Vieira. “Soube pela imprensa da decisão da emissora.”
O ex-apresentador da Jovem Pan reafirmou que a direção da rádio ordenou-lhe que se retratasse. “Neguei”, disse, ao ressalvar que não deveria expor tal divergência publicamente. “Como posso pedir desculpa por algo correto? Disse algo com absoluta correção — gramatical, moral, ética, frasal, sintática, semântica.”
No acordo que teria firmado com o governo federal, a Jovem Pan informou que pretende diminuir o espaço para o jornalismo no rádio.
A programação da madrugada, que exibia repetições dos programas de maior audiência da emissora, será formada apenas por músicas. Agora, a programação ao vivo irá até as 22 horas.
Fonte: https://revistaoeste.com/no-ponto/jovem-pan-sorri-para-o-governo-lula/