Impasse sobre dinheiro para países mais vulneráveis atrasa acordo na COP26

John Kerry, enviado especial para o Clima dos Estados Unidos, conversa com delegados das Ilhas Marshall na COP26 — Foto: Phil Noble/Reuterst

O financiamento para adaptação dos países mais vulneráveis aos impactos da crise climática, além de ajuda concreta aos que já sofrem perdas e danos irreparáveis são os temas bloqueando a COP26, em Glasgow. A conferência da ONU sobre mudanças climáticas deveria ter terminado na sexta-feira (12), mas diante dos impasses, as discussões continuam neste sábado (13).

Uma plenária informal para análise dos textos de negociação que, refinados, podem compor o acordo final, não aconteceu ainda. Foi convocada para as 10h da manhã (7h no Brasil), adiada para o meio-dia (9h no Brasil) e novamente postergada para 14h30 (11h30 no Brasil). Começou pouco após 15h e, apesar dos apelos do presidente da conferência, Alok Sharma, para que fosse rápida, várias nações se inscreveram na lista para falar.

O novo texto é muito fraco no mecanismo de perdas e danos, antiga demanda das nações que mais estão sendo afetadas pela emergência climática. Os Estados Unidos e também a Europa não aceitam a reivindicação, uma espécie de compensação aos pequenos e vulneráveis pela mudança do clima que eles não causaram.

O tema avança muito vagarosamente desde o Acordo de Paris, há seis anos. Os EUA não querem reconhecer uma vinculação direta entre quem está causando as perdas — os países industrializados — e os danos. A União Europeia também não.

Na versão de sexta-feira do acordo havia um termo mágico — a criação de “facilities”, expressão vaga que pode ganhar força conforme a estratégia política das delegações presentes à COP. Para os países que defendem a compensação por perdas e danos, poderia ser o início de um fundo a ser negociado na próxima COP, no Egito, em 2022.

Mas o termo caiu da versão do texto apresentada pela presidência britânica da COP26 hoje de manhã, o que produziu enorme insatisfação das delegações das pequenas ilhas e países muito afetados por inundações como Bangladesh.

Desde a gestão de Barack Obama (2009-2017), os EUA tentam resolver a questão de forma tangencial, colocando à disposição dos países seguros privados mais baratos. Está longe de ser suficiente.

Também querem que o tema seja contemplado pelo Fundo de Adaptação, que tem poucos recursos — cerca de US$ 800 milhões — e é de difícil acesso pelos países pequenos e mais pobres.

Foto: Divulgação | Reuters

Os países industrializados se comprometem apenas com assistência técnica aos mais vulneráveis. Na COP de Madri criou-se uma espécie de plataforma virtual, a Santiago Network, para dar assistência a quem perde tudo por inundação ou seca.

O tema ganhou muita magnitude em Glasgow. É evidente que a emergência climática se agrava.

— Quando somos afetados por um furacão, perdemos tudo e leva ao menos dois anos para conseguirmos alguma ajuda — diz um delegado de país insular.

O outro tópico pendente de resolução, também sobre financiamento, está vinculado à regulamentação dos mercados de carbono.

O texto do famoso Artigo 6 do Livro de Regras do Acordo de Paris parece ter tido consenso dos países em seus aspectos técnicos. Acontece que apenas uma parte dos países se beneficia dos mercados de carbono. Os mais vulneráveis, não.

Há, por isso, uma demanda de criação de uma taxa sobre as transações de carbono tanto no artigo que trata das operações entre países como naquele que regulamenta o comércio entre empresas.

No texto atual, apenas a parte do artigo 6.4, da transação de emissões entre empresas, prevê uma taxa para alimentar o Fundo de Adaptação.

O maior volume de transações, contudo, vêm das negociações de créditos entre países. Os EUA se opõem à ideia porque não admitem um imposto criado internacionalmente incidindo em relações bilaterais.

A União Europeia também não aceita, embora exista uma divisão no bloco. Alemanha e alguns países nórdicos são mais flexíveis à ideia.

Sempre se soube que financiamento poderia criar impasses na COP 26. É o momento em que os pequenos podem fazer valer sua voz em um sistema em que decisões são tomadas por consenso. No regime da Convenção do Clima, Tuvalu ou Gana podem ter a mesma força que os Estados Unidos ou a China.

A compensação por perdas de danos exigida pelos países mais vulneráveis a desastres climáticos não deve ser confundida com outro debate, sobre o financiamento da transição verde nos países em desenvolvimento, no qual as nações ricas prometeram reunir US$ 100 bilhões por ano a partir de 2020. O montante também nunca foi alcançado.

Por Daniela Chiaretti, Valor/Globo

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