“Nós existimos graças a Galileu”, diz o padre argentino José Funes, 47 anos, doutor em astronomia e diretor do observatório do Vaticano. Galileu Galilei, que viveu nos séculos 16 e 17, teve a obra científica proibida ao afirmar que a Terra se movia e foi condenado à prisão domiciliar perpétua pela Igreja. “Algumas pessoas não entenderam o que ele estava fazendo.” Por causa disso, em 1891 o Papa Leão XIII resolveu fundar o observatório para mostrar que a Igreja não era contra a ciência. Aqui, um bate-papo com o padre sobre seu trabalho e as contradições entre fé e conhecimento.
A Igreja atrapalha suas escolhas de pesquisa?
José Gabriel Funes – Não. Nós temos liberdade total para fazer nossas pesquisas, não recebemos nenhuma ordem do Vaticano a respeito disso. A única motivação dos 14 integrantes do observatório é o nosso interesse pessoal. Nossa equipe está dividida em duas partes. Uma fica aqui em Castel Gandolfo, na Itália, outra em Tucson, nos Estados Unidos.
Você vê alguma implicação religiosa numa possível descoberta de vida extraterrestre?
Funes – Até agora nós não temos nenhuma prova sobre a existência de vida em outras partes do Universo. É um assunto muito interessante para a astrobiologia (ou exobiologia, o estudo da origem, evolução, distribuição e o futuro da vida no Cosmos). O observatório já esteve envolvido com este tipo de pesquisa no passado. Se encontrarmos vida fora do planeta Terra — e eu digo se em letras maiúsculas —, não vejo nenhum problema relacionado à teologia ou à nossa crença em Deus como criador do Universo. Eu acho que isso é perfeitamente compatível com a Criação. Durante o ano passado, houve uma reunião na Pontifícia Academia das Ciências do Vaticano e nós discutimos astrobiologia. Isso é uma prova de que a Igreja está aberta a quaisquer descobertas que podem vir no futuro. Mas, eu reitero, ainda não temos nada, nenhuma prova em relação à vida fora daqui.
Você acha que a ciência pode ser usada para provar que Deus não existe?
Funes – O conhecimento que vem da ciência é só uma visão parcial da realidade. Há muitas outras coisas que vão além da ciência. E você não pode usar somente métodos científicos para descrever ou abordar a realidade. Há verdades nas artes e na literatura, e a ciência não pode mensurar ou descobrir este tipo de coisa. Você não pode reduzir a realidade à ciência porque nós somos maiores do que isso.
