Como as construtoras podem reduzir a pegada de carbono

Na Europa, a Comissão Europeia propôs atualização ao desempenho energético de sua instrução normativa para construções em dezembro de 2021

Foto: Divulgação

As construtoras escaparam, em grande medida, do nível de atenção concentrada dirigido pelos ambientalistas às empresas de petróleo e gás, ou aos bancos. Mas o cimento e outros materiais de construção são responsáveis por emissões de carbono significativas, que o setor tenta sanear.

Segundo a Agência Internacional de Energia (AIE), cerca de 33% das emissões ligadas a energia e processo globais em 2021 foram direta ou indiretamente produzidas pelo setor de construção, com aproximadamente 6% do total global tendo sido gerados pela produção industrial do cimento, aço e alumínio usados na construção civil. A AIE diz também que a intensidade de emissões da fabricação de cimento — a quantidade de CO2 por tonelada — aumentou cerca de 1,5% ao ano de 2015 a 2021.

“As edificações são o epicentro de uma parte bastante significativa da pegada de carbono”, reconhece Guy Grainger, diretor global de sustentabilidade da empresa internacional de imóveis comerciais JLL.

Há anos investidores ativistas ambientais e fundos de pensão de organizações religiosas brigam com empresas devido a suas emissões de carbono. Mas quase nenhuma campanha se voltou para as construtoras americanas, segundo mostram prestações de contas encaminhadas à autoridade reguladora do país.

Agora, os governos interferem cada vez mais para incentivar as construtoras a serem mais verdes. Nos EUA, artigos da histórica Lei de Redução de Inflação visam reduzir as emissões de gases-estufa causadas por projetos de construção financiados pelo governo federal.

Cidades americanas também têm introduzido padrões rígidos, de Nova York a Scottsdale, no Arizona. Em outubro de 2022, o prefeito de Nova York, Eric Adams, assinou um decreto destinado a reduzir as emissões de carbono nos projetos de construção municipais — e o documento inclui um apelo em favor do aumento do uso do concreto de baixo carbono.

Na Europa, a Comissão Europeia propôs atualização ao desempenho energético de sua instrução normativa para construções em dezembro de 2021. Entre as maiores mudanças apresentadas está a certificação do “potencial de aquecimento global do ciclo de vida” de uma edificação — todas as emissões de gases-estufa decorrentes de sua construção, operação e desativação.

Essas atualizações propostas já fizeram com que as maiores construtoras europeias investissem em produtos novos, mais verdes. Elas também estão modernizando a maneira com que abrem licitações para obter trabalho.

A empresa suíça de materiais de construção Holcim vende seus produtos de selo verde por um valor mais elevado, observaram analistas do Morgan Stanley em relatório do ano passado. Atualmente seu concreto de baixo carbono, o EcoPact, representa 10% das vendas, mas a empresa prevê que essa fatia crescerá para 25% até 2025, disse o Morgan Stanley. A Holcim anunciou recentemente que seu concreto de baixo carbono está sendo usado em novos centros de dados destinados a abrigar a divisão de serviços de internet da Amazon.

Na França, a construtora Eiffage trabalha com a Hoffmann Green Cement, um membro do grupo emergente de fabricantes de cimento de baixo carbono. Thomas Atkinson, diretor de desenvolvimento internacional da Hoffmann, diz que, pelo fato de seu processo não requerer aquecimento em forno — fonte de emissões significativas de carbono na produção de cimento convencional —, seu produto se tornou mais competitivo quando os custos com energia deram um salto, no ano passado.

“Estamos próximos de ter o mesmo preço hoje — talvez [seja] um pouco mais”, destaca ele.

Graças a essa crescente pressão regulatória e pública, a “demanda por produtos de baixo carbono no setor de material de construção vai crescer muito, progressivamente, nos próximos cinco anos”, prevê o analista de crédito Renato Panicho, da S&P Ratings.

“Talvez vejamos o setor se distanciar, por meio da diversificação, do cimento padrão apenas”, com empresas capazes de manter os lucros estáveis, diante da alta dos custos do carbono, ao cobrar preços mais elevados pelo fato de serem mais verdes. Mas um dos maiores obstáculos a uma adoção mais acelerada do cimento de baixo carbono é a dificuldade de obter garantias e seguro para um novo produto, diz Grainger. “As pessoas muitas vezes testam novas tecnologias e assumem riscos.”

A JLL estima que 80% dos prédios de escritório atuais ainda estarão em uso em meados do século. Assim, para manter baixas as emissões de carbono, as empresas tendem a fazer o retrofit de prédios preexistentes, em vez de derrubá-los para recomeçar do zero.

Grainger também aponta para o crescente uso de madeira nas novas construções graças ao aperto da regulamentação sobre emissões de carbono e ao crescimento do contingente de inquilinos que solicita alternativas de construção verdes.

No norte da Europa, as novas construções que incorporam madeira podem alcançar nada menos que 10 a 15 andares, e “sua aparência é absolutamente incrível”.

No entanto, poucos materiais conseguem reproduzir a pura e simples dureza e acessibilidade financeira do cimento, diz Panicho. Isso significa que o setor tem de redobrar seus esforços no campo da tecnologia destinada a captar e armazenar carbono, argumenta ele — mas apenas as maiores indústrias estão assumindo a liderança nessa atividade.

Quanto à possibilidade ou não de as empresas de cimento conquistarem a neutralidade em carbono até 2050 — um objetivo declarado da entidade de classe Global Cement and concrete Association —, Panicho se abstém de avaliar. “[É] difícil prever”, diz ele.

Fonte: Valor Econômico

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