O discreto charme do conservadorismo

O conservador sabe que o caminho para o progresso é uma evolução cautelosa, com prudência, sem experimentos radicais, respeitando a tradição, a liberdade e os direitos

Por Roberto Motta (*)

Sou um engenheiro que criou um partido, e que virou político, depois escritor e, finalmente, jornalista e comentarista. Mas sou um cidadão comum, que tenta apenas dar testemunho de tudo o que vi e vivi.

E, meninos, já vi muita coisa. Fui fiscal do Sarney. Testemunhei inflação de 70% ao mês. Fiz conta em URV. Paguei US$ 3 mil por uma linha de telefone fixo e precisei esperar dois anos pela instalação. Dirigi carro a álcool de primeira geração (tinha que dar partida com gasolina e esperar meia hora para esquentar o motor) e comprei kit de primeiros-socorros.

Programei em computador da Cobra e tive um TK 85 com um gravador de fita cassete acoplado.

Fui ao comício pelas Diretas Já, em 1984, na Candelária, no Rio (sim, a esquerda já me enganou um dia), ouvi pelo rádio do meu Chevette a notícia da internação de Tancredo Neves e assisti ao debate final da eleição de 1989.

Boa parte dessa história está nos meus livros.

Publiquei o primeiro, Ou Ficar a Pátria Livre, em 2016. Foi o mesmo ano em que me desliguei do partido que ajudara a criar, o Partido Novo. Meu primeiro livro é um manifesto, o grito de indignação de um cidadão que subitamente desperta para uma realidade perigosa, violenta e corrupta.

Capa do livro Ou Ficar a Pátria Livre, de Roberto Motta | Foto: Divulgação

 

O segundo livro foi publicado em 2018. Ele se chama Jogando Para Ganhar: Teoria e Prática da Guerra Política. A intenção do livro é servir como um manual para liberais e conservadores, que encontram dificuldades em um campo dominado pelo populismo e pela ideologia. Uma segunda edição do livro, revisada e reduzida, acaba de ser publicada.

Capa do livro Jogando Para Ganhar, de Roberto Motta | Foto: Divulgação

Em 2018, deixei meu último cargo no mundo corporativo para me candidatar pela primeira vez em uma eleição. Apesar de ter sido o segundo candidato a deputado federal mais votado do partido, não fui eleito, mas acabei convidado a participar da transição do governo estadual. O Rio de Janeiro se encontrava sob intervenção na área de segurança. Coordenei a transição do gabinete de intervenção federal para as recém-criadas Secretarias de Polícia Civil e Militar, e depois permaneci por 17 dias comandando a Secretaria Estadual de Segurança, que foi então extinta.

Em janeiro de 2021, quebrei o tornozelo e fui forçado a passar três meses imobilizado. Um amigo me disse: “Aproveite esse tempo e conte a história do Novo”. Foi assim que nasceu meu terceiro livro, Os Inocentes do Leblon, que conta a verdadeira história da criação e dos primeiros anos do partido.

Capa do livro Os Inocentes do Leblon, de Roberto Motta – Foto: Divulgação

No início de 2022, em um jantar em São Paulo, conheci dois executivos de uma empresa de mídia que estava promovendo uma revolução cultural no país. Conversei com eles sobre um sonho antigo: um documentário sobre o panorama da segurança no Brasil. Eu já tinha feito várias tentativas anteriores, mas ninguém se interessava pelo tema.

Dessa vez dei sorte. A empresa resolveu levar o projeto adiante. O nome da empresa é Brasil Paralelo. O documentário que eles produziram se chama Entre Lobos, e bateu recorde de espectadores. Mas era preciso registrar tudo aquilo por escrito, e assim surgiu meu quarto livro, A Construção da Maldade.

Capa do livro A Construção da Maldade, de Roberto Motta – Foto: Divulgação

Minha experiência na política me convenceu da importância dos valores morais. Política sem moral é uma das piores atividades nas quais o homem pode se envolver. A política sem moral é, invariavelmente, voltada para o engrandecimento pessoal do político ou para seu enriquecimento.

A política sem moral flerta com regimes totalitários, com o populismo rasteiro, e subscreve, ou considera aceitável, a pregação revolucionária.

Para mim se tornou evidente que a moral deve preceder a política e a economia. Mas eu tinha dificuldade de encontrar confirmação para meu posicionamento. Até que um dia, lendo autores como Edmund Burke, Russell Kirk, Roger Scruton e Olavo de Carvalho, descobri que outros pensavam da mesma forma que eu.

Foi aí que eu, que fui enganado pela esquerda quando jovem e comecei na política como liberal, me descobri conservador. Para mim, o conservadorismo é o aperfeiçoamento do liberalismo.

O primeiro fundamento do conservadorismo é a crença em uma ordem transcendente, uma lei natural que funciona como a consciência da sociedade. O conservador acredita em preceitos morais e éticos que independem da época em que ele vive. Ele sabe que uma racionalidade estreita não pode, sozinha, satisfazer as necessidades humanas.

A realização plena da vida não depende da construção de uma sociedade perfeita, utópica, nascida dos devaneios de planejadores todo-poderosos e implantada a ferro e fogo através da destruição de todo o legado da humanidade. Isso é o que Hayek chama de racionalismo construtivista: a ambição de redesenhar a sociedade do zero, esquecendo o passado. Esse é o núcleo do projeto revolucionário comunista, socialista ou progressista.

Retrato do economista austríaco-britânico Friedrich Hayek – Foto: Reprodução

Mas homens não são anjos; portanto, não é possível construir um paraíso terrestre. O conservador reconhece nessa utopia política quase uma religião, e se recusa a adotá-la.

A satisfação do ser humano depende, na verdade, do cumprimento de um pacto transcendente, feito entre os que já morreram, os vivos e os que ainda vão nascer. É em nome desse pacto que nos dedicamos a proteger e cuidar de nossas famílias, de nossa cidade e de nosso país, e a trabalhar para conservar a liberdade, a lei, a educação, os empregos, a saúde e o meio ambiente. Conservar é o ato que dá nome ao pensamento: conservadorismo.

Em vez de se apegar a dogmas, o conservador guia sua atividade política por princípios gerais. Esses princípios foram formulados ao longo de anos, com equilíbrio, através do desenvolvimento dos costumes e tradições. Mas até esses princípios precisam ser aplicados com prudência, de forma adequada a cada nação e a cada época. Esta é outra definição do conservadorismo: a política da prudência.

Tanto o impulso de renovar quanto o desejo de conservar são necessários ao perfeito funcionamento de uma sociedade. A hora de adotar uma ou outra estratégia depende das circunstâncias. É preciso reconhecer que nem toda mudança é positiva; inovações ou reformas inadequadas ou mal planejadas, em vez de sinalizar progresso, podem representar o início de graves conflagrações sociais. Por isso o conservador desconfia, acima de tudo, de mudanças radicais.

Toda a civilização ao nosso redor levou séculos para ser construída, mas pode ser destruída em pouco tempo. Esse é o objetivo dos revolucionários. O conservador sabe disso. Por isso não existe “conservador radical”.

O conservador não deve ser confundido com o reacionário, que deseja o retorno a uma época imaginária no passado, na qual tudo era perfeito. Nunca existiu época assim. Na verdade, o reacionário é a imagem espelhada do revolucionário

Os conservadores acreditam na igualdade diante de Deus e perante a lei, mas reconhecem no conceito de igualdade material uma impossibilidade lógica e moral — já que a condição de cada um depende sempre, em maior ou menor grau, do resultado dos seus esforços. A busca pela igualdade material a qualquer custo é um instrumento de criação de regimes totalitários. Todos os homens têm os mesmos direitos, mas não têm direito às mesmas coisas.

O Estado que se propõe a fazer a distribuição da riqueza é, necessariamente, um Estado que viola o direito natural à propriedade. Os direitos de propriedade e de liberdade estão intimamente conectados. Quebrada essa conexão, o Estado se torna senhor de tudo e de todos.

O conservador não deve ser confundido com o reacionário, que deseja o retorno a uma época imaginária no passado, na qual tudo era perfeito. Nunca existiu época assim. Na verdade, o reacionário é a imagem espelhada do revolucionário. Os dois desejam uma mudança radical: o reacionário quer a mudança radical para voltar ao passado, e o revolucionário quer a mudança radical para criar uma utopia.

O conservador sabe que o caminho para o progresso é uma evolução cautelosa, com prudência, sem experimentos radicais, respeitando a tradição, a liberdade e os direitos, e adaptando os conceitos teóricos às exigências práticas da vida real.

Ilustração: Paul Craft/Shutterstock

Nossa civilização foi construída em cima da filosofia grega, do direito romano e da ética e moral judaico-cristãs. Há muita gente tentando destruir isso:

    • Os radicais que pregam o abandono da cultura ocidental e buscam reescrever a história, menosprezando grandes conquistas e líderes do passado.
    • Os que defendem pautas como coletivização, censura e liberação das drogas.
    • Aqueles que sabotam o Direito, transformando a Justiça em instrumento de engenharia social.
    • Aqueles que promovem ideologia como se fosse cultura e “desconstroem” sistemas de ensino, trocando matemática, português e ciência por promoção de conflito étnico, luta de classes e demonização da prosperidade.

É preciso resistir a esses ataques. Por isso me tornei conservador.

Na minha opinião, construída ao longo de muitos anos através de custosas lições, é essencial que toda atividade política e social incorpore aspectos do conservadorismo, especialmente preocupações com a preservação da cultura, com a defesa incondicional da liberdade, opondo-se a todo tipo de totalitarismo, e com a apresentação de uma pauta clara de valores morais — esta última, elemento essencial para enfrentar as questões mais críticas do país: a impunidade e os ataques ao sistema de Justiça criminal.

Como conservador, não acredito em nenhuma ideologia. Minhas ações são determinadas por meus valores e pelo princípio da prudência.

Na minha opinião, ser conservador no Brasil hoje é defender, no mínimo, liberdade econômica, liberdade de expressão, liberdade de ir e vir, direito inviolável à propriedade privada, igualdade perante a lei, combate rigoroso ao crime, educação sem ideologia e redução da máquina do Estado e da carga de impostos

Não acredito em revoluções, apenas no progresso construído com trabalho e sacrifício. Não acredito em nenhum tipo de coletivismo ou socialismo e rejeito todos os regimes totalitários. Por isso me tornei conservador.

Foto: Billion Photos/Shutterstock

(*) Engenheiro PUC/RJ com Mestrado em Gestão Empresarial FGV/RJ, Professor, Escritor com 2 livros publicados, Empreendedor, Pai e Ativista de Segurança Pública

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