Um Banco Central lulista?

Lula quer uma licença para gastar como se não houvesse amanhã, quebrando o termômetro do mercado

Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, e Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República - Foto: Montagem Revista Oeste/Marcos Oliveira/Marcelo Chello

Por Rodrigo Constantino (*)

Na véspera da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) para decidir a nova taxa Selic, e num momento em que analistas do mercado preveem que os juros vão parar de cair, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva atacou nesta semana o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Lula afirmou que o comportamento da instituição é a única coisa “desajustada” na economia do país. E comparou Campos Neto ao ex-juiz e hoje senador Sergio Moro (União-PR), que foi o responsável por condená-lo na Lava Jato. Segundo o petista, Campos Neto tem “lado político” e não demonstra “capacidade de autonomia”.

É justamente o oposto: a gestão do Banco Central talvez seja a única coisa ajustada na economia brasileira hoje. Lula quer uma licença para gastar como se não houvesse amanhã, quebrando o termômetro do mercado. Para lulistas, a febre não é um sintoma de algo errado com o organismo, mas aenas algo que deve ser escondido por meio de um termômetro manipulado. Lula considera o mercado um “dinossauro voraz” sem “sentimentos”, e quer trocá-lo pelo vago conceito de “justiça social”. O Banco Central independente é uma pedra nesse caminho populista.

Roberto Campos Neto, atual presidente do Banco Central, indicado pelo ex-presidente da República Jair Messias Bolsonaro – Foto: Lula Marques/Agência Brasil

A estabilidade da moeda é uma das grandes conquistas dos países mais avançados, lembrando que historicamente o que tivemos foi o abuso do mecanismo da inflação por autoridades. Por outro lado, a desvalorização da moeda sempre esteve ligada a crises políticas graves, bastando pensar na República de Weimar antes de Hitler subir ao poder e na Venezuela atual, além da Argentina antes de Javier Milei chegar ao poder.

Historicamente, o próprio mercado, ou seja, os indivíduos praticando trocas voluntárias, escolheu moedas “sólidas”, como metais preciosos. Com o tempo, surgiu a demanda por um padrão, por moedas mais hegemônicas, e assim nasceram as moedas fiduciárias, mas sempre com lastro em ouro ou prata. A tentação, porém, para “desvalorizar” essa moeda por parte dos governos era quase irresistível, já que eles poderiam se apropriar de forma mais velada da riqueza alheia, uma espécie de imposto disfarçado.

Vários foram os momentos em que governos adotaram deliberadamente políticas inflacionárias para expandir gastos. “Inflação é o complemento fiscal do estatismo e do governo arbitrário”, disse o austríaco Ludwig von Mises. O controle parlamentar das finanças públicas funciona somente se o governo não puder apelar para gastos não autorizados através do aumento da circulação de papel-moeda. A política inflacionária costuma ser bastante popular, em grande parte pela compreensão inadequada de seus efeitos. Aqueles que demandam tal política estão sempre focando apenas um lado da equação — o seu próprio. O que eles desejam é um aumento nos preços daquelas commodities e dos serviços que eles vendem, enquanto gostariam de ver os demais preços inalterados.

Ludwig von Mises foi um economista da Escola Austríaca, historiador e sociólogo – Foto: Ludwig von Mises Institute/Wikimedia Commons

Os ingênuos encaram a emissão de moeda pelo governo como uma espécie de milagre econômico. O fiat money é como se fosse um fiat lux! O governo cria algo ex nihilo, num estalo de dedos. O lastro para esse dinheiro não precisa ser mais do que o toner das impressoras do Tesouro. Um papel emitido pelo governo assume automaticamente o poder de ser trocado por qualquer mercadoria desejada. É a alquimia finalmente alcançada. Mises ironiza: como parece tímida a arte das bruxas se comparada com aquela do Departamento do Tesouro!

O poder da impressão de dinheiro artificial nas mãos do governo sempre foi um enorme risco para a liberdade e prosperidade dos povos. Esse poder foi utilizado de forma abusiva desde quando o imperador romano Diocleciano resolveu reduzir o teor metálico das moedas, fazendo com que perdessem valor real. Em situações mais emergenciais, essa prerrogativa sempre costuma ser usada pelos governos. Em tempos de uma suposta ameaça de guerra ou crise econômica, os governantes acreditam na necessidade urgente de aumento dos gastos públicos, mas muitas vezes a maioria do povo não concorda. O governo então ignora a saída democrática de propor uma votação sobre os necessários sacrifícios momentâneos, preferindo o caminho do engano, através da política inflacionária.

Antigas moedas romanas sofreram redução do teor metálico, perdendo valor real – Foto: Bukhta Yurii/Shutterstock

Não há transparência sobre os custos reais das medidas, e o governo se aproveita da ignorância das massas. O recurso inflacionário garante ao governo os fundos que ele não conseguiria captar através dos impostos diretos ou por emissão de dívida. Eis o verdadeiro motivo para uma política inflacionária. Seus defensores são inimigos do “dinheiro sólido” e, concomitantemente, da liberdade individual. Eles querem expropriar a riqueza alheia tal como piratas.

A política monetária é o instrumento que um banco central tem para conter a expansão creditícia que produz inflação. Quando leigos no assunto olham apenas o efeito imediato e criticam decisões de aumento de juros, podemos dar um desconto. Mas, quando economistas e empresários caem na mesma falácia da miopia, levantando a falsa dicotomia de mais inflação e mais crescimento, aí temos muito o que temer. Afinal, a estabilidade dos preços e a maior previsibilidade advinda dela são fundamentais para o crescimento sustentável da economia. Essa confiança é o pilar que sustenta o crescimento no longo prazo, favorecendo o crédito e, acima de tudo, os investimentos produtivos. Eis os pilares que muitos querem derrubar, pedindo menor controle inflacionário para ter mais crescimento imediato.

O PT ataca Campos Neto desde o primeiro dia, como bode expiatório para os males econômicos produzidos pelo desgoverno lulista

Muitos preferem usar a taxa de juros como bode expiatório para nossos males, em vez de focar o cerne da questão. O dilema é entre um crescimento sustentável ou um voo de galinha. Para seguir pelo primeiro caminho, faz-se necessário um rígido controle da inflação, através de uma meta baixa a ser obtida por meio de um banco central independente. É a fórmula de todo país desenvolvido. A taxa de juros mais baixa será resultado de um governo responsável, que gasta menos do que arrecada e não atrapalha tanto a iniciativa privada. Ou seguimos essa trajetória racional, ou ficaremos sempre reféns das maluquices de economistas que acham que riqueza se cria por decreto estatal.

Presidente Lula atacou Roberto Campos Neto e políticas do Banco Central durante uma entrevista à rádio CBN – Foto: Reprodução/Rádio CBN

Essa mentalidade é justamente aquela vigente em Lula e seus vassalos. Por isso o presidente e seu PT demonizam Campos Neto desde o primeiro dia, como se o presidente do Banco Central fosse um “inimigo do país” ou dos pobres. No fundo é o contrário: não fosse a independência do Banco Central aprovada pelo governo Bolsonaro, já teríamos um dólar acima de R$ 6 e uma inflação galopante. Com as falas desastradas de Lula, o nervosismo tomou conta do mercado novamente, com razão. Estranho mesmo foi tanto economista de mercado cair na falácia do Lula responsável.

Cada vez mais gente que fez o “L” para “salvar a democracia” percebe a furada em que se meteu. O PT ataca Campos Neto desde o primeiro dia, como bode expiatório para os males econômicos produzidos pelo desgoverno lulista. O presidente conta os dias para a saída de Campos Neto do comando do Banco Central, para colocar lá uma espécie de Fernando Haddad ou coisa pior, como Guido Mantega ou Aloizio Mercadante. Lula precisa de um poste sem luz própria para obedecer a seus desejos, ou um “desenvolvimentista” alinhado ao seu mapa de voo demagógico. A consequência disso todo mundo sabe qual será: a desgraça econômica. Esperar algo diferente é pura insanidade…

(*) Economista liberal-conservador, autor do best-seller “Esquerda Caviar” (Editora Record)

Fonte: https://revistaoeste.com/colunista/rodrigo-constantino/

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