TSE libertou Tabata Amaral de condições análogas às de escravidão eleitoral

Infidelidade partidária tomou conta da política, e o STF definiu que mudar de partido é perder o mandato; houve flexibilização, mas agora, o tribunal libera deputados como quem estoura cativeiro

Por José Maria Trindade*

O TSE autorizou Tabata Amaral a deixar o PDT sem perder mandato como deputada – Foto: Plínio Xavier/Câmara dos Deputados

A incrível história dos partidos que sequestram deputados está perto do fim. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) libertou a deputada Tabata Amaral em condições análogas às de escravidão eleitoral.

Esta é a primeira corrente quebrada, mas a fila já está formada e passa por outros partidos, como PSL, PSB e DEM. A origem desta prisão de mandato foi no plenário do Supremo Tribunal Federal, que se arrogou de legislativo e promoveu uma reforma eleitoral.

Primeiro, proibiu o financiamento de campanha eleitoral por empresas privadas sem definir um novo sistema, ou seja, um novo tipo de origem de recursos para os partidos e candidatos.

O financiamento acabou se transformando em público e, em ano eleitoral, R$ 3 bilhões do orçamento são torrados em campanha e organização partidária.

Na outra intervenção, os ministros estabeleceram que os mandatos são dos partidos e não dos eleitos. Isto fortaleceu as legendas partidárias, os donos dos partidos, estabeleceu a prisão eleitoral e mudou a forma de se fazer política.

Houve mudanças na própria Justiça. Os ministros flexibilizaram. Decidiram que governadores estão fora da regra por se tratar de mandato majoritário.

Depois, definiram que senadores entram neste critério e por último, que os deputados federais, deputados estaduais e vereadores podem pedir a desfiliação, desde que se prove que houve mudança de programa do partido ou discriminação pessoal.

A fusão partidária ou criação de um novo partido também foram consideradas condições para a desfiliação. Esta sentença do Supremo foi a reação ao tradicional troca-troca de partidos. Houve momentos em que um mesmo deputado trocava quatro vezes de partido no mesmo dia. Aos poucos, os partidos estão perdendo essa força sobre os seus deputados.

O próprio PSL, partido que elegeu o presidente Jair Bolsonaro, mudou. Não é o mesmo da eleição e hospeda adversários radicais do presidente que já até se desfiliou. O que falta é uma decisão dos próprios deputados e senadores votando no Congresso uma reforma política ampla e eficiente.

No momento, o debate é sobre financiamento de campanha, volta da coligação partidária e detalhes que não mudam a cara da política. Ninguém vota contra ele mesmo e os deputados e senadores não votarão regras que, por melhor que sejam, dificultem as reeleições deles.

Logo no primeiro debate polêmico desta legislatura, rupturas partidárias apareceram. A reforma da Previdência mostrou as diferenças.

Os militares, policiais e funcionários públicos eleitos por partidos de direita e governistas não aceitaram o projeto. Outros, em partidos contrários às mudanças, não gostaram dos votos dos deputados filiados em favor do projeto de reforma.

A disputa criou um novo tipo de parlamentar, o prisioneiro partidário. São mais de 20 nesta condição. O caso da deputada Tabata Amaral é um exemplo. Ela votou contra o PDT e a favor da Reforma da Previdência. Ganhou o ódio dos dirigentes. Eu ouvi de um dos líderes do partido de que ela seria uma “zumbi”.

Não poderia sair, sob pena de perder o mandato. O encarceramento é cruel. A deputada não foi indicada para nenhuma comissão, foi abandonada politicamente e o projeto partidário que contava com a candidatura dela à prefeitura de São Paulo acabou.

A deputada Tabata Amaral chegou a ser considerada pela cúpula do PDT como “um diamante a ser lapidado”. A lapidação deu errado, rachou a pedra preciosa. Agora livre, Tabata, que é primeira-dama em Recife, onde o seu namorado, o ex-deputado João Ramos, é prefeito, vai decidir a sua vida. Pode mudar de partido e até de Estado. Dizem que há planos para casamento.

Esta decisão não é só da deputada Tabata. Pelo menos 23 deputados estão nesta condição. Alguns já pediram a desfiliação e outros acompanham o posicionamento do TSE para a mudança. Haverá uma revoada geral com a liberação.

Os próprios deputados colocaram na lei a chamada “janela da infidelidade”, um mês para a mudança partidária sem risco de perder o mandato. Esta janela será em abril do ano que vem. Um famoso que brigou como o partido e vai trocar de legenda é o ex-presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia. Deve ir para o PSD. Era mesmo preciso mudar.

Antes, imperava a irracionalidade. Houve casos como o do ex-deputado Philemon Rodrigues que, cansado de mudar de partido, ele mudou de Estado e foi eleito. Philé, como era chamado na intimidade no Congresso esteve em quatro partidos num único dia. O motivo é que é assustador.

Fazer número para o partido conquistar benesses no Congresso, como sede partidária e número de assessores. Ele era deputado federal eleito por Minas Gerais. Mudou a filiação para a Paraíba e foi eleito no pleito seguinte. Ficou na situação estranha. Era deputado federal em pleno mandato por Minas Gerais e eleito pela Paraíba. Em política, a traição é levada às últimas consequências.

* É jornalista, comentarista político, correspondente da Jovem Pan em Brasília e escreve sobre o poder e seus bastidores.

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