Terreiros denunciam barreiras para acesso à isenção de IPTU em Manaus

Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

Em Manaus, terreiros de religião de matriz africana estão enfrentando barreiras burocráticas e custos tributários que comprometem sua dinâmica de culto, acolhimento e moradia comunitária — mesmo com a imunidade tributária assegurada por lei.

A Constituição Federal (Art. 150, VI, “b”) garante que imóveis pertencentes a templos de qualquer culto sejam isentos de IPTU — o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana. Em âmbito municipal, a Lei Municipal nº 956/2006 de Manaus regulamenta esse direito para imóveis “usados exclusivamente para fins religiosos”.

Um inquérito civil instaurado pelo Ministério Público Federal, em 23 de junho deste ano, aponta que as exigências da prefeitura podem configurar discriminação indireta contra os terreiros — comunidades tradicionais de matriz africana — que tentam garantir a imunidade.

Impacto do IPTU na rotina dos terreiros

Quando a isenção não se efetiva, o imposto pesa no cotidiano das comunidades. O valor do IPTU retira recursos que poderiam ser investidos em rituais, reformas, acolhimentos ou nas despesas domésticas do terreiro.

“Pagar o IPTU atrapalha… muitas vezes a gente precisa tirar de outra conta, de outro compromisso”, afirma a sacerdotisa Nochê Orny de Oxum Opará.

De acordo com ela, esse recurso tem impacto direto na função social e religiosa do terreiro — que atua também como espaço de escuta, cura e acolhimento gratuito da comunidade.

Burocracia, formalização e desconexão entre lei e prática

A advogada especializada em Direito Constitucional e Tributário, Luciana Santos (OAB 16.118/AM), afirma que “a lei fala qualquer culto, abrange todas as denominações religiosas” — incluindo os terreiros. No entanto, segundo ela, “o problema não está no texto da lei, mas na dificuldade de acesso a esse direito”.

Entre os entraves mais citados estão:

  • Ausência de CNPJ
  • Imóvel alugado (o que exige renovação da imunidade a cada contrato)
  • Comprovação de atividade exclusiva

Em muitos casos, a dinâmica dos terreiros — que envolve moradia, culto e acolhimento — desafia o modelo tradicional de “imóvel usado exclusivamente para fins religiosos” exigido pela regulamentação, excluindo-os de um direito que está formalmente garantido.

Enquanto isso, o custo do IPTU permanece como uma barreira estrutural que impacta o funcionamento comunitário. Para essas comunidades, o desafio não é apenas legal, mas profundo: trata-se do reconhecimento de uma forma de vida religiosa e territorial que vai além das categorias convencionais. Se a regulamentação se adaptar à realidade dos terreiros, não apenas a imunidade se tornará acessível, mas também se reconhecerá o valor sociocultural e espiritual dessas comunidades para a cidade.

Ação efetiva para ampliar o acesso ao direito

Como forma de enfrentar essas barreiras e ampliar o acesso à imunidade tributária, o Instituto Ganga Zumba, no âmbito da iniciativa Amazônia de Cores e como atividade que compõe os preparativos do Balaio da Oxum, está desenvolvendo um guia.

Este material visa apoiar terreiros na formalização jurídica e na solicitação de isenção do IPTU. O guia será elaborado com apoio de especialistas, reunindo orientações acessíveis para emissão de CNPJ, organização documental e trâmites legais. O material será disponibilizado gratuitamente, com o objetivo de fortalecer a autonomia dos terreiros e garantir o acesso a direitos assegurados por lei.

Assessoria de comunicação: Vívian Oliveira

DEIXE SEU COMENTÁRIO

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.