O legado de Balbina: floresta submersa, famílias esquecidas e ameaça que nunca cessou

Foto: Divulgação

A Usina Hidrelétrica de Balbina, localizada em Presidente Figueiredo, no Amazonas, volta ao centro de uma intensa polêmica. Quase quatro décadas após sua inauguração, a usina, há muito criticada pelo alto custo ambiental e baixa geração de energia, enfrenta hoje um duplo desafio: a reabertura de investigações sobre seus danos históricos e o risco contínuo de alagamentos que ameaçam milhares de moradores.

Comissão da Verdade de Balbina apura ecocídio e passivo social

Recentemente, a criação da Comissão da Verdade de Balbina (CVB), uma parceria entre a Defensoria Pública do Estado (DPE-AM), a Universidade Federal do Amazonas (Ufam), a USP e o Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB/AM), trouxe o foco de volta aos danos estruturais da usina.

A comissão tem como objetivo apurar os impactos sociais e ambientais da hidrelétrica, que alagou cerca de 2.400 km² de floresta, criando um dos mais controversos “cemitérios de árvores” da política energética brasileira.

  • Danos históricos: Balbina é citada como o pior exemplo de hidrelétrica do país, responsável por devastar o ecossistema local e afetar severamente povos tradicionais, como os Waimiri Atroari, além de deixar um passivo social de milhares de famílias ribeirinhas do Rio Uatumã sem indenização ou regularização fundiária.
  • Crime do presente: Pesquisadores e ativistas argumentam que os danos persistem. A decomposição da floresta submersa continua a gerar emissões de gases de efeito estufa, e análises recentes indicam a contaminação da água por coliformes em comunidades próximas, o que é um risco contínuo à saúde da população.
  • Visibilidade internacional: A Defensoria Pública chegou a levar a situação dos atingidos para ser debatida em eventos como a COP30, buscando visibilidade internacional para a luta por direitos e reparação.

Risco de cheia atinge comunidades e luta por plano de contingência

A segunda e mais urgente polêmica é o risco iminente de alagamentos que atinge as comunidades que vivem na jusante (abaixo) da barragem, ao longo do Rio Uatumã. Durante períodos de fortes chuvas, o reservatório de Balbina atinge seu limite operacional, e a abertura das comportas para liberar o excesso de água inunda dezenas de comunidades rurais.

  • Ameaça a 1.300 famílias: A liberação da vazão afeta cerca de 300 famílias, que sofrem com a perda de casas, acessos e produção agrícola.
  • Intervenção judicial: Em situações recentes, a Prefeitura de Presidente Figueiredo e o Ministério Público precisaram recorrer à Justiça para impedir a abertura das comportas sem um plano de contingência adequado. A Justiça tem exigido que a concessionária apresente um estudo de impacto e auxílio operacional e material para as famílias afetadas antes de qualquer liberação de água, sob pena de multa diária.
  • Comunidades mais afetadas: As áreas sob maior risco de inundação localizam-se principalmente ao longo do Ramal da Morena (ou Ramal da Cachoeira da Morena). As comunidades mais vulneráveis incluem:
    • Ramal da Morena
    • Céu e Mar
    • São José do Uatumã
    • São Jorge do Uatumã
    • Macaca-boia (ou Macacabóia)
    • Assentamento PDS Morena
  • Simulado e prevenção: Em uma ação preventiva, o município de Presidente Figueiredo tem trabalhado em um Plano Municipal de Contingência de Rompimento de Barragem, incluindo a realização de simulados com a população para definir rotas de fuga e pontos de encontro, visando fortalecer a cultura de prevenção e preparação.

A situação de Balbina é, portanto, um símbolo do debate amazônico: o custo real das grandes hidrelétricas, a urgência em resolver o passivo social de décadas e a necessidade crítica de transparência e planos de segurança para as comunidades que vivem sob a sombra de infraestruturas herdadas do passado.

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