
A Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE-AM) consolidou uma atuação que tem modificado a lógica da execução penal no estado, exercendo o papel de Custos Vulnerabilis. A tese, criada pelo defensor público amazonense Maurílio Casas Maia e reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), posiciona a instituição como guardiã das pessoas em situação de vulnerabilidade, permitindo sua intervenção em processos judiciais mesmo quando o assistido já possui advogado constituído.
A tese e sua aplicação na prática
A experiência no Amazonas demonstra que a atuação da DPE-AM como Custos Vulnerabilis tem sido fundamental para:
- Corrigir erros graves e evitar que pessoas permaneçam presas injustamente.
- Impedir violações de direitos dentro do sistema prisional.
A instituição tem identificado situações críticas, como:
- Penas somadas de forma incorreta.
- Condenações inexistentes incluídas nos cálculos.
- Guias de recolhimento que não chegam à Vara de Execução.
- Presos que permanecem segregados por anos sem análise judicial.
Tais problemas foram identificados porque defensores atuaram como órgão de execução penal, examinando casos que não haviam sido contestados por outros atores do sistema.
“O Custos Vulnerabilis nasceu da necessidade de impedir que vidas fossem engolidas pelas falhas do sistema. Quando atuamos, não substituímos advogados e muito menos o Ministério Público, pois somente garantimos que nenhum vulnerável seja invisibilizado onde a margem de erro pode ser fatal”, afirma o defensor público Maurílio Casas Maia, autor da tese.
Casos emblemáticos de intervenção
A atuação da Defensoria tem revertido injustiças graves.
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Erro de homonímia na capital
Um homem permaneceu preso além do tempo correto porque o cálculo de sua pena incluía, de forma equivocada, uma condenação por estupro que, na verdade, pertencia a um homônimo. A Defensoria analisou a situação, demonstrou o equívoco e conseguiu a retirada da pena indevida.
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Preso sem processo de execução
Um preso foi transferido de Iranduba para Manaus e ficou meses em uma unidade prisional sem processo de execução aberto, sem cálculo de pena e sem direito a progressão. O Núcleo de Atendimento Prisional identificou a situação em visita de rotina, regularizou o processo e conseguiu progressão de regime.
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Risco à integridade em Parintins
Em Parintins, a Defensoria interveio no caso de uma mulher, acusada de matar o ex-companheiro (policial militar), que estava isolada como única mulher em um presídio superlotado, em situação de risco extremo. A Defensoria demonstrou o risco e obteve a decisão pela liberdade para que ela pudesse responder ao processo fora daquele ambiente.
O impacto nas comunidades vulneráveis
O alcance da tese se estende a situações de vulnerabilidade social e cultural, como a de povos indígenas.
- Em Santo Antônio do Içá, uma mulher Kokama presa passou a ter acompanhamento direto da DPE-AM, mesmo com advogado, devido à sua vulnerabilidade cultural e social. O próprio Conselho Nacional de Justiça (CNJ) buscou informações da DPE-AM, reconhecendo-a como órgão responsável pela execução penal e acompanhamento dos presos.
O defensor Theo Costa destaca que o reconhecimento da tese tem fortalecido o diálogo com a advocacia particular, que, em muitos casos, solicita a participação da Defensoria para unir forças em prol dos direitos humanos.
Desafios da execução penal no interior e na capital
No interior do Amazonas
A Defensoria lida com desafios estruturais severos. A maioria das cidades não possui penitenciárias, apenas cadeias públicas improvisadas, sem banho de sol regular, oferta de trabalho ou itens básicos de higiene.
- A DPE-AM atua enviando recomendações, oficiando juízes e promotores, e acionando núcleos especializados para mitigar os danos e impedir que prisões ilegais se tornem rotina.
Na capital
A atuação como órgão de execução penal evita superlotação e corrige rumos. Os problemas mais recorrentes são:
- Demora judicial na análise de pleitos.
- Erros técnicos em cálculos de pena.
- Falhas no Sistema Eletrônico de Execução Unificado (SEEU).
O coordenador criminal da capital, Diêgo Castro, aponta que a Defensoria se tornou um mecanismo essencial de controle, capaz de visualizar violações e corrigir injustiças, o que reduz custos ao Estado e garante direitos básicos.
Consolidação do Custos Vulnerabilis
Decisões do STF e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) vêm consolidando a distinção da intervenção Custos Vulnerabilis, que não se confunde com a atuação do Ministério Público ou a representação do advogado. A tese é vista como uma manifestação da visão institucional do próprio “Estado Defensor”, colocando a Defensoria como instituição constitucional de proteção de direitos humanos.
Por Ed Salles/ DPE-AM











