
“A Amazônia diante da reforma que redefine o mapa econômico do Brasil”
Por Nelson Azevedo (*)
O Brasil acaba de entrar em um novo ciclo institucional com a reforma tributária.
Mais do que uma atualização técnica, ela representa uma refundação da relação entre Estado, empresas e sociedade, baseada em três pilares: simplicidade, neutralidade e transparência.
Esses princípios, ao eliminarem distorções históricas e o cipoal de regras estaduais, criam um ambiente tributário capaz de recolocar o país — e a Zona Franca de Manaus (ZFM) — no radar dos grandes fluxos de investimento global.
A simplificação como passaporte para a integração
A simplificação tributária é, na prática, um instrumento de competitividade internacional.
A desoneração plena da produção e a devolução rápida de créditos eliminam barreiras que, por décadas, afastaram o Brasil das cadeias produtivas globais.
Agora, o empresário amazônico pode planejar, investir e exportar com segurança jurídica. O novo modelo de Imposto sobre Valor Agregado (IVA), composto pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), garante previsibilidade, uniformidade e um sistema digital transparente, compatível com as práticas da OCDE e da Organização Mundial do Comércio.
Essa convergência normativa reduz o “Custo Brasil” e permite que a indústria manauara negocie em pé de igualdade com parceiros da América do Sul, da União Europeia e da Ásia, sem o temor de autuações, bitributação ou guerra fiscal interna.
De enclave industrial a plataforma de integração
O grande desafio da Zona Franca de Manaus sempre foi a distância entre a riqueza que produz e a distribuição dessa riqueza no território amazônico.
A nova realidade tributária abre a possibilidade de transformar o polo industrial num ecossistema de conexões produtivas, integrando inovação, pesquisa, bioeconomia e tecnologia em redes que vão além da capital e do modelo tradicional de montagem.
Com segurança jurídica e sistema simplificado, a ZFM pode:
- Atrair indústrias complementares, voltadas à economia verde e circular.
- Estimular cadeias regionais de valor, incorporando produção florestal, alimentos, fármacos naturais e tecnologias limpas.
- Negociar parcerias internacionais com base em critérios de compliance e rastreabilidade, credenciais essenciais para os novos mercados de carbono e sustentabilidade.
A reforma, portanto, liberta o Amazonas da dependência de incentivos e o coloca no caminho da sofisticação produtiva.
Diversificar, adensar e regionalizar
O modelo tributário anterior limitava a expansão das cadeias produtivas amazônicas por meio da fragmentação fiscal.
Com a unificação do sistema, o Polo Industrial pode diversificar sua base, adensar sua produção e regionalizar o desenvolvimento — três verbos que, juntos, descrevem o próximo estágio da Zona Franca.
- Diversificar é incorporar novos segmentos, como biotecnologia, dermocosméticos, química verde, semicondutores e tecnologias de sensoriamento da floresta.
- Adensar é criar conexões locais entre as empresas existentes, ampliando o conteúdo regional dos produtos e fortalecendo a indústria de componentes.
- Regionalizar é interiorizar a prosperidade — expandir o modelo para o Alto Solimões, o Médio Amazonas, o Baixo Rio Negro — onde capital natural, energia renovável e conhecimento tradicional formam uma tríade econômica promissora.
Com o novo sistema, a cooperação federativa substitui a guerra fiscal. A Zona Franca, antes defensiva, torna-se ofensiva: uma plataforma de convergência econômica e ambiental.
A diplomacia tributária da amazônia
A simplificação do sistema é também uma oportunidade de diplomacia econômica.
A Amazônia passa a poder negociar com transparência e previsibilidade, requisitos essenciais para parcerias internacionais em:
- Transição energética;
- Créditos de carbono e no comércio de serviços ambientais;
- Acordos verdes bilaterais.
A partir da segurança jurídica da reforma, o Amazonas pode se apresentar como território confiável para investimentos ESG (Environmental, Social and Governance), com um modelo de desenvolvimento alinhado ao Acordo de Paris e à COP30 de Belém. Essa nova arquitetura tributária é, portanto, um instrumento de credibilidade global.
Da indústria incentivada à economia inteligente
O verdadeiro desafio da Zona Franca, agora, não é preservar isenções — é transformar incentivos em inteligência.
A base fiscal estável permite migrar de uma política defensiva para uma política estratégica, voltada à inovação, educação tecnológica, ciência de dados e sustentabilidade.
A redistribuição da riqueza produzida pela ZFM deve se materializar em capital humano, infraestrutura, pesquisa e novas vocações regionais, de modo que a prosperidade industrial se traduza em inclusão social e sustentabilidade ambiental.
Um novo normal
A reforma tributária inaugura um novo tempo para o Brasil e para a Amazônia. Ela simplifica sem empobrecer, moderniza sem excluir e, sobretudo, restaura a confiança na lei como instrumento de desenvolvimento.
A Zona Franca de Manaus entra nessa era como símbolo da maturidade nacional: um modelo que nasce do incentivo, mas que agora precisa florescer pela integração, pelo conhecimento e pela eficiência produtiva.
Simplificar é o primeiro passo, integrar é o destino.
Com segurança jurídica, competitividade internacional e compromisso com a floresta em pé, a Amazônia pode — e deve — ser o novo nome da produtividade brasileira.
(*) é economista, empresário e presidente do SIMMMEM (Sindicato da Indústria Metalúrgica, Metalomecânica e de Materiais Elétricos de Manaus), conselheiro do CIEAM e da CNI e vice-presidente da FIEAM.







