Manaus avança no lixo enquanto Iranduba trava no próprio projeto

Foto: Dhyeizo Lemos / Semcom

A gestão de resíduos sólidos na Região Metropolitana de Manaus atravessa um momento decisivo marcado por contrastes. De um lado, a capital amazonense avança para solucionar um passivo ambiental de quatro décadas com a construção de um moderno aterro sanitário na AM-010. Do outro, um projeto similar no município vizinho de Iranduba enfrenta forte oposição técnica e bloqueios judiciais.

O prefeito David Almeida realizou uma visita técnica nesta segunda-feira, 15 de dezembro, ao KM 19 da rodovia AM-010. A inspeção no local confirmou que a primeira célula do novo aterro de Manaus já alcançou 75% de execução física. O cronograma segue em dia e o início das operações está previsto para fevereiro de 2026.

O fim de um problema histórico na capital

Para o chefe do Executivo municipal, a estrutura representa a superação de um desafio que se arrastava há 40 anos. Durante a vistoria, David Almeida enfatizou a legalidade e a importância da obra:

“Estamos finalizando, com 75% de execução, a primeira célula de um total de quatro que serão implantadas neste aterro sanitário, que obedece a todas as normas do Conselho Nacional do Meio Ambiente, em especial a resolução nº 430. Essa é uma solução construída pela Prefeitura de Manaus, em conjunto com o Ministério Público e o Tribunal de Justiça do Amazonas, por meio da Vara do Meio Ambiente, após a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta. É uma resposta definitiva para a destinação dos resíduos sólidos da nossa cidade.”

O prefeito ainda reforçou o caráter tecnológico do empreendimento:

“Esse é um dos aterros sanitários mais modernos do Brasil. Com ele, damos uma solução definitiva para um problema ambiental histórico de Manaus e avançamos com responsabilidade, planejamento e respeito ao meio ambiente.”

Tecnologia e aproveitamento energético

O novo aterro ocupa uma área de 67 hectares e foi projetado para receber até 2.600 toneladas de resíduos por dia. A segurança do solo e do lençol freático é garantida por um sistema de impermeabilização composto por quatro camadas, incluindo geocomposto bentonítico e geomembrana de polietileno de alta densidade.

Além disso, o projeto prevê a geração de energia limpa. O biogás gerado pela decomposição do lixo será convertido em biometano, combustível capaz de abastecer cerca de 80 veículos pesados por dia, contribuindo para a redução das emissões de gases de efeito estufa.

A polêmica e os riscos do projeto em Iranduba

Enquanto Manaus consolida sua solução, uma proposta de instalação de outro aterro no município de Iranduba, próximo ao KM 19 da rodovia Manoel Urbano (AM-070), tem gerado fortes críticas.

O professor da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e doutor em Administração, André Costa, classifica a ideia como um erro estratégico. Ele relembra a expectativa positiva da população com o desenvolvimento da região, mas alerta para o retrocesso:

“Surge em Iranduba ideia de jerico que ameaça estragar uma das principais chances da Região Metropolitana de Manaus provar sua capacidade de gestão ambiental: Fazer aterro concorrente ao de Manaus, logo após a Ponte do Rio Negro.”

O impacto no trânsito e na agricultura

A crítica de André Costa recai pesadamente sobre a logística do projeto, que pretende receber lixo de diversos municípios, como Itacoatiara, Presidente Figueiredo e Rio Preto da Eva. Isso implicaria em caminhões de lixo cruzando áreas turísticas e a própria Ponte Rio Negro.

Para o especialista, essa movimentação coloca em risco o solo rico da região, conhecido pela terra preta e fundamental para o abastecimento de alimentos, além de contradizer a lógica de integração metropolitana. Ele sugere que, se os municípios querem soluções próprias, deveriam transformar seus lixões em aterros menores e modernos, em vez de exportar o problema.

Uma alternativa econômica para Iranduba

Como alternativa ao aterro de lixo comum, o professor propõe que a área em Iranduba tenha uma destinação mais nobre e rentável, focada no Polo Industrial de Manaus (PIM):

Professor André Costa – Foto: Divulgação

“Faça naquele terreno o maior projeto de economia circular da região, tratando especificamente de insumos e produtos do PIM. São bens duráveis valiosos, fáceis de serem retornados ao mercado, e com empresas multinacionais ávidas para demonstrarem ganhos ambientais às suas matrizes no Primeiro Mundo.”

Ele conclui com um conselho direto aos empreendedores:

“Ou seja, dá para ganhar dinheiro fazendo o certo, dormindo bem à noite com a consciência tranquila, e sem reforçar na população o sentimento de ojeriza à sua marca.”

Entenda a diferença jurídica entre as obras

É fundamental distinguir a situação legal dos dois empreendimentos citados para compreender a segurança jurídica de cada um. O novo aterro sanitário de Manaus, localizado na AM-010, não é apenas uma obra do executivo, mas o cumprimento de uma determinação judicial consolidada.

O projeto está blindado por um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado entre a Prefeitura de Manaus e o Ministério Público do Amazonas (MPAM). Em abril de 2024, a 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) homologou este acordo, reconhecendo a obra como a solução oficial e necessária para a Política Nacional de Resíduos Sólidos na capital. Portanto, há consenso entre prefeitura, promotoria e judiciário sobre a legalidade e a urgência desta construção.

Já o cenário em Iranduba é oposto. O projeto de aterro privado no município vizinho enfrenta barreiras severas na justiça. O Ministério Público do Amazonas ajuizou ações civis públicas pedindo a suspensão do licenciamento, apontando riscos ambientais às comunidades locais e falhas no processo, como a falta de estudos aprofundados sobre o impacto na região turística.

Acatando os argumentos da promotoria, o Tribunal de Justiça já proferiu decisões suspendendo licenças do empreendimento em Iranduba. O entendimento atual do judiciário é de cautela extrema, bloqueando o avanço da obra vizinha enquanto o mérito das irregularidades apontadas pelo MPAM não for totalmente esclarecido.

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