
A Formação Axé-Amém é uma iniciativa inédita no Brasil focada na construção de pontes e no diálogo entre diferentes expressões da fé negra. O projeto reuniu pessoas negras evangélicas e de religiões de matriz africana para articular estratégias de enfrentamento ao racismo religioso e promover a integração mútua através da fé.
A iniciativa é do Instituto de Estudos de Religião (Iser) e culminou na produção do livro “Axé-Amém: Encruzilhadas da Fé Negra no Brasil”.
Livro reúne vivências e memórias de 37 autores
Durante quatro meses, o Iser acolheu 37 escritores selecionados para produzir a obra. A publicação reúne vivências, memórias familiares, formação política e práticas de resistência espiritual dos autores, com foco na dupla pertença religiosa — o sentimento de identificação e conexão com mais de uma tradição de fé.
Os textos foram pautados no conceito de Escrevivência, desenvolvido pela escritora Conceição Evaristo. Trata-se de uma escrita que parte da experiência individual para narrar as histórias coletivas de uma comunidade.
Superação do preconceito religioso
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Para Amanda Damasceno, uma das autoras, a participação na formação Axé-Amém veio após um processo pessoal de transformação e aceitação familiar. Evangélica e mãe de dois filhos, ela relata ter enfrentado dificuldades ao aceitar que sua filha mais velha se iniciasse no candomblé aos 16 anos.
“Como evangélica, sempre me ensinaram que as religiões de matriz africana eram demonizadas. Ao mesmo tempo que eu queria apoiar a minha filha, tinha muito medo. Por isso que eu sempre falo, hoje o meu propósito é combater o racismo religioso na sociedade, mas para isso tive que combatê-lo em mim, a transformação teve que partir de mim”, relata Amanda.
O babalorixá Igor Almeida reforça que o projeto é uma forma de quebrar paradigmas e construir um novo olhar de respeito entre as vertentes da religiosidade negra no Brasil.
“Nosso país é pluralista, nós temos aqui uma pluralidade de religiões, de desinências, não somente negra, indígena, mamelucos, e a gente precisa aprender a ter respeito, não somente na desinência religiosa, mas no simples fato de querermos ser alguém dentro de uma sociedade”, afirmou.
Obra como ferramenta de diálogo e educação

O livro foi lançado no Rio de Janeiro na última terça-feira (2). Carolina Rocha, pesquisadora do Iser e uma das idealizadoras da formação, classifica a iniciativa como uma “cartografia afetiva de existências que não cabem no discurso do ódio”.
A alta adesão de pessoas evangélicas ao edital público de seleção dos autores foi considerada uma surpresa positiva pelos idealizadores do projeto.
“Esperamos que o livro funcione como ponte, não como muro. Ele foi pensado para ser lido em igrejas, terreiros, comunidades, bibliotecas, escolas e rodas de formação”, afirma Carolina Rocha.











